O PÓS-MODERNISMO NAS LETRAS-POEMAS DE THIAGO E*
Carmen Maria do Carmo Sousa Costa**
Dayanne Lises da Silva Costa
Marineri Alves de Sousa
Nayra Roberta Pereira da Rocha
Rafael Gonçalves Freire
O objetivo deste artigo é analisar as letras-poemas do jovem poeta piauiense Thiago E e identificar nelas características de um autor pós-moderno. Para desenvolvê-lo, faz-se mister algumas considerações em torno do que vem a ser o Modernismo e o Pós-Modernismo, estabelecendo uma diferenciação entre ambos.
Thiago Pereira e Silva, com nome artístico Thiago E, nasceu em Teresina-PI, em 14 de março de 1986. Cursou o ensino fundamental na Escola Santa Angélica, o médio no Colégio Sagra e de 2004 a 2008 fez o curso de Letras/Português da Universidade Federal do Piauí. Atualmente, Thiago E integra a Validuaté, uma das melhores bandas do cenário musical piauiense que conta com dois cds gravados, Pelos Pátios Partidos em Festa |2007| e Alegria Girar |2009|. No grupo, além de participações nos vocais e de tocar cavaquinho e pandeiro, o músico compõe, sendo, concomitantemente, professor de português em escolas da rede municipal de Teresina, revisor e elaborador de provas para concursos e participante da Academia Onírica, que conduz o movimento Poesia Tarja Preta, reunindo artistas vários em redor do fazer poético.
O Modernismo resultou de um processo que durou, aproximadamente, cinquenta anos, com início ainda no fim do século XIX. Mas foi nas três primeiras décadas do XX que se deu o confronto entre o “novo” (revolução industrial, progresso científico e tecnológico, ascensão da burguesia urbana, etc.) e as formas culturais e ideológicas do passado (mentalidade medieval, aristocrata e religiosa), aparecendo, efetivamente, novas concepções de vida e de arte, com a racionalização da sociedade e da cultura. A arte, até então atrelada à Igreja e à aristocracia, libertou-se, assumiu formas mais independentes e passou a ser lugar de questionamentos e contestações. A “nova” arte que surgiu expandiu-se para diversos países além dos europeus, dentre eles o Brasil, e recebeu o nome de Arte Moderna.
Essa “nova” arte trazia inovações que combatiam o passado, o tradicionalismo, o academicismo e renegavam a “arte pela arte” presente, por exemplo, no Parnasianismo. Na literatura, o Modernismo revela um caráter multifacetado através dos seus movimentos de vanguardas (futurismo, cubismo, expressionismo, dadaísmo e surrealismo), que apresentam uma anarquia literária baseada na liberdade de expressão, incorporação do cotidiano à temática, uso de linguagem coloquial, releituras de textos famosos por meio de paródias, intertextualidades e dialogismos, sem dizer da consciência nacional, da denúncia e, no caso do Brasil, de um regionalismo crítico.
Embora existam muitas discussões sobre o advento do Pós-Modernismo, inclusive se o mundo está mesmo vivenciando a Pós-Modernidade como um novo estilo ou se ela consiste apenas numa segunda tendência do ciclo modernista, isso não impossibilita que sejam ressaltados alguns fatos que configuram transformações representativas na sociedade e na cultura ocidental. Segundo Domício Proença Filho
Entres as manifestações que intensificam ao extremo traços modernistas, entendemos que se situam, por paradoxal que possa parecer, o Movimento da Poesia Concreta e Instauração-Práxis. A transição citada se evidencia no Tropicalismo e no Movimento do Poema-Processo: Os traços pós-modernos podem ser encontrados mais acentuadamente em alguns textos da poesia marginal e na prosa de determinados autores contemporâneos.
Dentre as características do Pós-Modernismo, as que mais se destacam são a intensificação do elemento lúdico na criação literária, a utilização deliberada da intertextualidade, o ecletismo estilístico, o exercício da metalinguagem, o fragmentarismo textual, a autoconsciência e auto-reflexão, a radicalização de posições anti-racionalistas e antiburguesas. Na literatura, enquanto o modernista valoriza a razão, o saber e a consciência nacional e apresenta uma poesia com tom de denúncia, o pós-modernista ri levianamente de tudo, sendo-lhe essencial apagar a diferença entre o real e o imaginário. No Modernismo, o aprofundamento do eu com o mundo e a literatura construtiva e politizada contrariam o ambiente pós-moderno, que não informa sobre o mundo, transformado em espetáculo. A liberdade de experimentação e a invenção provenientes do Modernismo diferenciam-se no Pós, pois há interesse de destruir a forma do romance (enredo, assunto e personagem) para dar lugar ao pastiche, à paródia e ao uso de formas gastas e de massa. Na verdade, configura-se como uma das principais marcas pós-modernistas a despreocupação com o momento social vivenciado, o que contrasta com o Modernismo, cujos autores romperam com a “arte pela arte” e refletiram a revolta com o panorama social da época.
Constatam-se características pós-modernas nas letras-poemas do poeta Thiago E. Sua desvinculação das angústias sociais é, por exemplo, notória em letras como A Lenda do Peixe Francês e Superbonder. Nesta, é possível deparar-se com a anticosmovisão inerente ao homem pós-moderno, pois seu eu-lírico tem uma visão da realidade que, sem se vincular com as demais opiniões, cria a própria verdade. É importante explicitar que o Pós-Modernismo não rejeita só as cosmovisões opressoras e universais, mas também a possibilidade de se ter uma visão de mundo coerente, o que faz Thiago E quando diz:
Caos pós-moderno de uma civilização
E a gente grita supersupersuperbonder
E no mundo não há mais separação
Em meio a isso, surge uma arte experimental, que se quer expressão e não informação social, de modo que o sujeito passa a participar da obra, ao invés de produzi-la como objeto. Essa criação baseada na experiência de cada um é facilmente encontrada na letra de Eu Só Quero Acabar com Você, em que o eu-lírico expressa a sua intimidade:
Traz uma cachaça pra vê se
Passa a escuridão – porra de vida!
Ah! Se ele já não me abraça
O peito ga-ga-gueja a raiva doida
Na letra de A Lenda do Peixe Francês, destaca-se o pastiche - obra de arte em que se imita o estilo ou modo de realização de outra - de A Lenda do Pégaso, de Jorge Mautner. Nesta, o escritor diz que
Era uma vez, vejam vocês, um passarinho feio
Que não sabia o que era, nem de onde veio
Então vivia, vivia a sonhar em ser o que não era
Thiago E constrói o seu poema iniciando-o da mesma forma e desenvolvendo-o a partir da insatisfação com a própria existência, como ocorre nos seguintes versos:
Era uma vez um peixe francês
Soturno e muito triste
Se perguntava: será que existem maiores mágoas
Que as minhas nestas águas?!
O texto pós-moderno é, assim, repleto de intertextualidade. Na letra de Plaina Maravalha, por exemplo, nos versos Todo anjo é terrível e Um cão faminto só tem fé na carne, Thiago E recorre a frases de Rainer Maria Rilke e Tchekhov. Essa letra foi escrita através de fragmentos: o autor partiu de uma frase de Tchekhov, de uma foto de Theda Bara (atriz norte-americana e sexy simbol dos anos 20) e de um comentário que o seu companheiro de banda, José Quaresma, fez sobre a plaina, uma ferramenta de carpintaria que tira lascas da madeira, e da maravalha, que é o nome dessas lascas que se soltam. Nota-se, ainda, o respeito à verdade moral de cada um, já que é papel do pós-moderno apagar a perspectiva de moralidade geral ou absoluta.
Como se está vivenciando a Pós-Modernidade, qualquer definição dela será, neste momento, inconclusiva. Mesmo assim, como já foi dito, há transformações expressivas nesse processo de transição entre o Modernismo e o Pós-Modernismo e se as observam nas letras-poemas de Thiago E. Então, se dizer que ele é um poeta pós-moderno seria precipitado, é lícito afirmar também que, no presente, as letras-poemas de Thiago E apresentam marcas que possibilitam inseri-lo nesse estilo de época em vigor.
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*Artigo produzido na disciplina Literatura Nacional: Autores Piauienses, ministrada, na UFPI, pelo prof. Airton Sampaio, no período 2011.2.
**Estudantes de Letras/Português na Universidade Federal do Piauí.
(1995, p. 52), na literatura brasileira podem-se perceber características que diferem do Modernismo após a década de 50:
"(1995, p. 52), na literatura brasileira podem-se perceber características que diferem do Modernismo após a década de 50:"
ResponderExcluirEsse trecho, posto no rodapé, na verdade deve aparecer, no texto, logo após "Domício Proença Filho..."